10 de setembro de 2025
Maturidade em sala de aula: Cresce número de pessoas idosas na graduação da UFRN
Autor: Daniel Menezes
Juliana Estevam – Sala de Ciência-Agecom/UFRN
O Brasil está passando por um acelerado processo de envelhecimento populacional, e o Rio Grande do Norte acompanha essa tendência. Segundo o Censo 2022, a população brasileira com 60 anos ou mais chegou a 32,1 milhões de pessoas, o que representa 15,6% do total. No Rio Grande do Norte, o índice de envelhecimento alcançou 53,05, o maior do Nordeste, indicando que há 53 pessoas com 65 anos ou mais para cada 100 crianças de até 14 anos.
Esse cenário é resultado do aumento da expectativa de vida e da queda na taxa de fecundidade. Com mais longevidade e melhor qualidade de vida, muitos idosos têm aproveitado essa etapa para retomar projetos interrompidos, como o ingresso em cursos de graduação, redescobrindo o aprendizado como um instrumento de autonomia e realização pessoal. Esse movimento tem ganhado força em todo o país, com o crescimento da presença de pessoas idosas nas universidades.

Francisca ingressou em Química após se surpreender positivamente com o curso de Turismo e considera retornar à primeira escolha – Foto: Cícero Oliveira – Agecom/UFRN
A participação de pessoas idosas no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) tem crescido de forma expressiva. Segundo o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), vinculado ao Ministério da Educação (MEC), o número de inscritos com 60 anos ou mais saltou de 9.950 em 2024 para 17.192 em 2025, um aumento de 72,7% em apenas um ano. Entre os 4,3 milhões de candidatos totais do exame, esse crescimento revela um interesse crescente da população idosa pela educação formal.
Essa valorização da aprendizagem ao longo da vida também se reflete no ensino superior. Na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), o número de ingressantes com mais de 60 anos cresceu 944% nos últimos 20 anos. Em 2004, apenas 9 idosos ingressaram na graduação, número que saltou para 94 em 2024. O aumento também é expressivo entre aqueles que completaram 60 anos durante o curso: eram 37 em 2004 e chegaram a 125 em 2024.

Estudantes idosos buscam, principalmente no Centro de Ciências Sociais Aplicadas (CCSA), cursos relacionados à experiência profissional ou à atuação em cargos de liderança
Segundo levantamento da Pró-Reitoria de Graduação (Prograd), alguns dos cursos mais procurados por esse público, em 2024, foram História e Filosofia. Fabiano do Espírito Santo Gomes, procurador educacional institucional da UFRN, explica que muitos desses cursos são escolhidos como um hobby, por uma paixão específica por essas áreas. “Com o tempo mais livre, muitas vezes, eles podem acabar optando por esses cursos”, comenta. Outro curso em destaque é Ciências e Tecnologia (C&T), impulsionado pela curiosidade de entender melhor o universo das novas tecnologias e inovações.
Exemplos que inspiram
A evolução tecnológica e o desejo por aprender motivaram Antonio Tavares a ingressar na graduação de Engenharia Elétrica. Um dos mais velhos da turma, formou-se aos 67 anos. Aos 81, relembra com entusiasmo sua trajetória acadêmica. “Nunca faltei a uma aula. Quando a gente quer aprender, não tem tempo ruim, não”, afirmou. Após sua graduação, ainda ingressou em um minicurso de informática pelo Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN).

Aos 67 anos, Antônio se formou em Engenharia Elétrica com uma pesquisa sobre energia eólica no RN, antecipando um setor que só se consolidaria anos depois – Foto de arquivo pessoal
Francisca Ferreira da Silva vê a universidade como um espaço de conhecimento, interação e lazer, livre da pressão do mercado de trabalho. Após se aposentar, sentiu falta de algo que preenchesse sua rotina depois de 33 anos de trabalho. Em 2024, ingressou no curso de Turismo na UFRN e, no final do ano, prestou novamente o Enem, sendo aprovada em Química, graduação que já havia iniciado anteriormente, mas não pôde concluir. Agora, com os filhos criados e mais tempo disponível, segue firme no sonho de obter um diploma universitário. “A universidade é muito acolhedora. Aqui é como se fosse meu lazer. Saio das minhas obrigações e venho pra cá”, compartilha Francisca.
Já para José Donato Gomes da Silva, de 65 anos, a motivação para ingressar na graduação em Serviço Social veio de três fatores principais: viver uma nova experiência universitária em um ambiente repleto de inovações tecnológicas, aprimorar seu trabalho voluntário em uma comunidade terapêutica e também satisfazer sua paixão pelo conhecimento. “Eu sentia necessidade. Como autodidata, os livros já não eram o bastante. Era como se eu nunca tivesse estado em uma universidade. E agora, estou começando de novo”, relata.

Formado em Contabilidade e apaixonado por tecnologia, Donato ingressou na UFRN para viver uma nova experiência acadêmica, explorando inovações tecnológicas e os desafios do ensino superior na terceira idade – Foto: Cícero Oliveira – Agecom/UFRN
Para Donato, ingressar na universidade foi a parte fácil. Durante sua trajetória, no entanto, enfrentou dificuldades decorrentes do etarismo, a discriminação baseada na idade, e barreiras para ingressar em estágios, pesquisas e trabalhos científicos. “Já me jogaram vários baldes de água fria, como: ‘Cuidado, quando terminar o doutorado, já estará na idade de se aposentar’. Mas isso não me abalou. Ainda mantenho essa ideia. Mesmo que seja apenas uma questão de método”, desabafa Donato, que sonha em ser professor ou atuar na carreira científica.
Apesar de ainda não ser idosa, Magna Costa faz parte da geração 50+ que vem ressignificando o processo de envelhecimento por meio da educação. Ingressou na UFRN em 2021, na primeira turma do Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades e, desde então, mergulhou em novos saberes, ambientes acadêmicos complexos e experiências fora da sua zona de conforto. A egressa define essa vivência como uma ruptura de um viver empírico para um viver científico. Para Magna, voltar a estudar depois dos 50 é mais do que buscar um diploma: é exercitar a autonomia, desenvolver o pensamento crítico e aproveitar o prazer de aprender com maturidade.
Acolhimento
A UFRN possui iniciativas que contribuem para o envelhecimento saudável desse público, como ações de acessibilidade digital para os ingressantes em cursos superiores, que auxiliam nos processos acadêmicos, e atividades de promoção à saúde, voltadas para a terceira idade. Em parceria com o Instituto Envelhecer (IEN), a instituição desenvolve pesquisas que contribuem para a orientação e formulação de políticas institucionais voltadas à ampliação do acesso e da permanência dos estudantes idosos na universidade.
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