25 de março de 2024

Estudo da UFRN revela dados sobre homicídio de mulheres em domicílios: feminicídio aumentou no nordeste pela elevação do número de armas

Autor: Redação

Estudo da UFRN revela dados sobre homicídio de mulheres em domicílios

Do Saiba Mais

Por Louise Chacon

Mais de 26 mil mulheres foram assassinadas dentro de casa entre os anos de 2000 e 2022 no Brasil, o que equivale a três mortes por dia. Desse total, 60% dos assassinatos foram cometidos por companheiros e ex-companheiros. É o que revela um estudo realizado pelo Programa de Pós-Graduação em Demografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). O trabalho foi realizado a partir de dados extraídos do Sistema de Informação Sobre Mortalidade do SUS (SIM/DATASUS), que é alimentado pelas declarações de óbito no país, e também do Atlas da Violência, desenvolvido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

A pesquisa foi coordenada pela professora Karina Cardoso Meira (PPGDem/UFRN) e realizado em parceria com Jordana Cristina de Jesus (PPGDem/UFRN), Eder Samuel Oliveira Dantas (Hospital Onofre Lopes – Huol/UFRN), Raphael Mendonça Guimarães (Escola Nacional de Saúde Pública Fiocruz) e Rafael Tavares Jomar (Instituto Nacional de Câncer).

Playvolume00:01/01:00saibamaisTruvidfullScreen

Leia mais

 

O estudo revela, inclusive, o panorama regional dos homicídios de mulheres assassinadas em domicílio. As regiões Centro-Oeste e Norte apresentaram uma taxa de mortalidade maior que a nacional. No Sul e Sudeste, durante esse período, houve redução desse tipo de homicídio. Já no Norte e Nordeste, aconteceu um aumento nas taxas. O Centro-Oeste se manteve estável, mas apresentou as taxas mais elevadas do país.

Fonte: Sistema de Informação sobre mortalidade do Departamento de Informática do SUS (SIM/DATASUS).

As causas para o aumento das taxas

Karina Meira, que coordenou o projeto, explica que a violência contra mulher não está desvinculada da violência geral que ocorre na sociedade, o que poderia explicar o aumento nas taxas no Norte e Nordeste: “Essas regiões apresentaram aumento na violência como um todo durante esse período”, explica a pesquisadora, citando que houve uma disseminação e interiorização da violência para essas regiões no período analisado.

Além disso, ela chama atenção para a falta de estrutura adequada na disponibilidade de ações e equipamentos para as mulheres que sofrem violência nessas regiões, apontando as falhas do Estado em protegê-las. "As mulheres do Norte e Nordeste não têm tanto acesso a mais equipamentos, como casa abrigo, delegacias especializadas de atendimento à mulher e serviços de acolhimento à vítima de violação sexual. Então fica difícil da mulher conseguir romper com a situação da violência”, argumenta.

Ela cita, também, a ascensão do discurso anti gênero nos últimos anos como um fator contribuinte para o aumento na violência às mulheres. “Existe um grupo de pessoas que se sente no direito de violentar corpos femininos, negros, indígenas e LGBTQIA+ para poder manter uma estrutura familiar conservadora e patriarcal”, explica Karina, a qual também frisa que há “um estimulo à formação da masculinidade hegemônica, quando o homem tem que ser forte, bravo e dominar a casa; enquanto a mulher tem que se voltar ao ambiente doméstico”.

O aumento da circulação das armas de fogo no último período também foi uma causa citada por Karina para as maiores taxas de violência contra a mulher. “Ter uma arma de fogo dentro de casa é um dos principais fatores de risco para que uma mulher sofra violência física e feminicídio”, explica a pesquisadora. De acordo com dados colhidos por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) e analisados pelo Instituto Sou da Paz e Instituto Igarapé, só no ano de 2022 o número de compras de armas por civis foi maior do que em 2018, 2019 e 2020 somados.

Não basta empoderar

Karina defende que o Estado precisa se responsabilizar pela vida das mulheres. “É necessário investir nisso, e não enxugar o orçamento das políticas de prevenção, controle e enfrentamento à violência contra a mulher", defende.

Em 2018, pouco mais de 8% dos municípios brasileiros contavam com delegacias especializadas no atendimento à mulher e apenas 9,7% ofereciam serviços especializados de atendimento à violência sexual. No mesmo ano, somente 2,4% dos municípios tinham casas abrigo de gestão municipal para mulheres em situação de violência doméstica. Os dados são do Perfil dos Municípios Brasileiros (Munic), divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

“É muito mais uma questão do Estado e da sociedade se responsabilizar por reduzir a violência contra a mulher do que simplesmente uma questão individual de empoderá-la para ela não aceitar a violência. A gente vê casos repetidos de mulheres que se empoderam, denunciam e se separam, e então são assassinadas”, argumenta Karina. “Não é a mulher, sozinha, que vai resolver a situação”, finalizou.

 

Essa reportagem faz parte do projeto “Ser Mana, Mulher", idealizado pela Agência SAIBA MAIS para produção de pautas dedicadas a temas que impactam diretamente a vida das mulheres, ao tempo que contamos as histórias de Mulheres.

[0] Comentários | Deixe seu comentário.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado.