28 de novembro de 2025
Relatório da CGU expõe desvio de função no DNOCS/MDR (2021–2023) e sustenta a Operação Fake Road, que cumpriu mandados em Natal e Fortaleza
Autor: Daniel Menezes
A Polícia Federal deflagrou nesta quinta-feira (28) a Operação Fake Road, que cumpriu mandados em Fortaleza e Natal para investigar um esquema de superfaturamento em obras de pavimentação financiadas por emendas parlamentares e executadas pelo DNOCS do Ministério de Desenvolvimento Regional. A ação, porém, não surgiu do nada: ela se apoia diretamente na vasta radiografia produzida pela Controladoria-Geral da União (CGU), cujo relatório sobre a atuação do órgão entre 2021 e 2023 havia exposto, com antecedência e em detalhes, exatamente o padrão de desvios que agora é alvo da PF. Os contratos somam 1,1 bilhão.
O documento da CGU já demonstrava que o DNOCS se afastara completamente de sua missão institucional de combate à escassez hídrica. Segundo a auditoria, 60% de todas as contratações do período foram destinadas a pavimentação, urbanização, recuperação de vias e compra de máquinas, atividades que nada tinham a ver com o enfrentamento da seca, mas que passaram a ser o núcleo da atuação do órgão por influência direta de emendas parlamentares. O relatório alertava que tal distorção não era apenas administrativa — era um vetor de risco para corrupção, superfaturamento e fragilização da política hídrica no semiárido.
A CGU também já havia registrado um conjunto de falhas sistêmicas que, agora, aparecem como elementos centrais da Operação Fake Road: ausência de critérios técnicos na escolha dos municípios beneficiados, contratos pulverizados por interesses políticos, baixa coordenação com outros órgãos federais e falta de controle efetivo sobre obras e serviços. A auditoria destacou que o DNOCS, ao atuar sem planejamento e sem foco, abriu espaço para “ações sem aderência finalística e sem comprovação de necessidade pública”, deixando brechas que a PF agora investiga como possível formação de organização criminosa.
Enquanto o órgão deveria priorizar perfuração de poços, manutenção de barragens, construção de adutoras e ações de segurança hídrica, o relatório mostrou que grande parte dos recursos foi desviada para obras de pavimentação — exatamente o campo onde a operação policial identificou suspeitas de superfaturamento, medições fraudulentas e execução parcial ou inexistente. O que era, na CGU, um indício robusto de desvio de finalidade institucional, tornou-se hoje uma investigação criminal com prejuízo estimado em R$ 22 milhões.
A Operação Fake Road apenas confirma, portanto, o que o relatório de auditoria já havia antecipado: o DNOCS foi transformado em plataforma de obras alheias à sua função de combate à seca, guiado por pressões políticas e por um modelo de execução desconectado de critérios técnicos e de interesse público. A investigação da PF não apenas dialoga com os achados da CGU — ela é consequência direta desse diagnóstico, que serviu como base metodológica e indício preliminar para a ação policial.
Ao desvelar o caminho que levou à operação desta semana, o relatório da CGU cumpre seu papel mais importante: mostra como a fragilização institucional de um órgão estratégico pode gerar terreno fértil para irregularidades, distorções orçamentárias e prejuízo ao semiárido. E evidencia que, sem a devolução do DNOCS à sua missão original, o ciclo de desvio de finalidade, mau uso de recursos e investigações tende a se repetir.
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