3 de setembro de 2025

Defesa questiona delação e diz que Bolsonaro não agiu contra a democracia, não discutiu minuta e não tem ligação com 8 de Janeiro

Autor: Daniel Menezes

G1 - A defesa de Jair Bolsonaro (PL) afirmou nesta quarta-feira (3) que o ex-presidente não atentou contra a democracia, não discutiu minuta golpista e não tem ligação com os atos violentos do 8 de Janeiro.

As declarações foram feitas pelos advogados Celso Vilardi e Paulo Cunha Bueno, durante a apresentação de alegações, no julgamento, na 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), do chamado "núcleo crucial" da trama golpista.

🔎O que pesa contra Bolsonaro? A investigação da Polícia Federal coloca Bolsonaro como planejador, dirigente e executor dos atos que levariam ao golpe de Estado. Um dos trechos do relatório afirma: "Tinha plena consciência e participação ativa" nas ações do grupo. Já a Procuradoria-Geral da República afirmou, em denúncia, que o ex-presidente liderou uma organização criminosa que praticou "atos lesivos" contra a ordem democrática e que estava baseada em um "projeto autoritário de poder".

 

 

"Vou demonstrar cuidadosamente: ele [Bolsonaro] não atentou contra o estado democrático de direito, e não há uma única prova. Esse papel, essa minuta, essa questão, esse depoimento, não há uma única prova que atrele o presidente a Punhal Verde Amarelo, a Operação Luneta e ao 8 de Janeiro", disse Celso Vilardi.

 

"Aliás, nem o delator — que eu sustento que mentiu contra o presidente da República —, nem ele chegou a dizer [que houve] participação em Punhal, em Luneta, em Copa [parte do plano Punhal Verde Amarelo, segundo a PGR], em 8 de Janeiro. Nem o delator [diz], não há uma única prova", completou o advogado de Bolsonaro.

Veja nesta reportagem as principais alegações da defesa (clique no link para seguir ao conteúdo):

 

 

 

 

Delação de Mauro Cid

 

Defesa de Bolsonaro questiona delação de Cid

 

 

 

 

 

Defesa de Bolsonaro questiona delação de Cid

Na sua manifestação, Vilardi também questionou pontos da delação de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. O defensor afirmou que as contradições do tenente-coronel são motivos para anulação da colaboração premiada. “Ele apresentou uma versão e alterou essa versão”.

"Ele [Cid] mudou a versão várias vezes. E isso não sou eu que estou dizendo, é, na verdade, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal, no último relatório de novembro, quando se disse que ele tinha inúmeras omissões e contradições", declarou.

Segundo o advogado, a delação de Cid, como proposta, não existe “em nenhum lugar do mundo”. “O que se propõe é reconhecer uma falsidade parcial da delação, ainda assim diminuir a pena”, emendou Vilardi.

Ele disse também que a defesa não teve acesso a provas utilizadas no processo e que não houve prazo suficiente para a atuação. Sobre esse ponto, Vilardi criticou a maneira como a PF disponibilizou as provas colhidas, que somavam mais de 70 terabytes de dados.

 

"Nós não tivemos o tempo que a Polícia Federal e o Ministério Público tiveram [para analisar as provas]. São bilhões de documentos. Eu não conheço a íntegra desse processo", declarou.

 

 

Ex-presidente não discutiu minuta, diz advogado

 

A defesa afirmou que a informação de que havia uma minuta golpista prevendo a prisão de autoridades está apenas nas palavras do delator Mauro Cid, porque a íntegra do texto nunca foi localizada pela investigação.

Segundo a Procuradoria-Geral da República, Bolsonaro e militares discutiram, dentro do Palácio da Alvorada, um texto que previa a decretação de estado de sítio para impedir a posse de Lula.

"Estado de defesa e estado de sítio são atos protocolares previstos na Constituição. Ele [Bolsonaro] deveria convocar o Conselho da República e o Conselho de Defesa e, após isso, submeter o decreto à aprovação do Congresso Nacional", disse o advogado Paulo Bueno.

 

"Eu insisto em dizer que o estado de defesa e o estado de sítio são dos atos mais colegiados da nossa legislação. Não são atos de força unilateral do presidente da República. E é indiscutível que o ex-presidente em momento algum deu início para a decretação dessas medidas constitucionais. E não há elemento que ateste que ele estava na iminência de fazê-lo", completou o defensor.

 

Em relação a um documento com esse teor que foi encontrado no celular do ex-presidente, a defesa afirmou que o arquivo foi enviado por um advogado e não foi debatido.

 

 

'Sem violência ou grave ameaça'

 

O advogado Celso Vilardi questionou o enquadramento das condutas de Bolsonaro nos crimes de golpe de Estado e de tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, que exigem a ocorrência de violência ou grave ameaça para serem configurados, segundo o Código Penal.

"Dizer que o crime de abolição do Estado Democrático de Direito começou numa live [com críticas às urnas, feita em julho de 2021], sem violência, é subverter o próprio Código Penal. É a execução da violência que consuma o delito. Não é possível falar em violência numa live sobre o TSE. Onde está a grave ameaça?", questionou Vilardi.

Para ele, no máximo, o que houve foram atos preparatórios, mas não a execução dos crimes imputados pela PGR. Assim, na visão do defensor, é injusto submeter Bolsonaro a uma possível pena de mais de 30 anos de prisão.

 

"Uma cogitação de pena, para além de 30 anos, para um fato específico que foi trazido – do ministro de Estado, dos chefes das Forças Armadas e de um presidente da república – sem nenhum ato, sendo que o general, em um procedimento de acareação, diz claramente: 'Nós tivemos aquela conversa e, depois daquela conversa, o presidente nunca mais tocou naquele assunto, o assunto foi encerrado'. Então, o assunto encerrado gerar 30 anos [de prisão] não é razoável", declarou o advogado.

 

O advogado Paulo da Cunha Bueno, que dividiu o tempo da sustentação oral com Vilardi, foi na mesma linha.

"Os atos preparatórios só poderiam ser puníveis se o legislador assim o fizesse. Nos crimes de terrorismo, criminalizaram-se os atos preparatórios", disse Bueno.

 

Bolsonaro não dificultou transição de governo, diz defesa

 

O defensor de Bolsonaro voltou a sustentar que ele realizou a transição para o governo Lula, no final de 2022, sem criar obstáculos — o que, na visão da defesa, contraria a acusação de tentativa de golpe.

 

"A prova produzida pela defesa mostra que o presidente Bolsonaro determinou uma transição", afirmou Celso Vilardi.

 

Uma prova disso, segundo Vilardi, é que os comandantes das Forças Armadas não estavam atendendo as ligações de José Múcio, nomeado ministro da Defesa por Lula no final de 2022, e Bolsonaro foi responsável por fazer uma ponte entre eles.

Sobre esse período, a defesa declarou que o ex-presidente pediu a caminhoneiros que obstruíram rodovias após a vitória de Lula nas eleições que liberassem as estradas.

Os advogados disseram ainda que, depois do dia 31 de dezembro de 2022, o ex-presidente não era mais responsável por nada.

Foto, advogado Celso Vilardi, que representa Jair Bolsonaro. — Foto: TON MOLINA/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO

Foto, advogado Celso Vilardi, que representa Jair Bolsonaro. — Foto: TON MOLINA/FOTOARENA/ESTADÃO CONTEÚDO

 

Crimes

 

A Procuradoria-Geral da República aponta que Bolsonaro cometeu cinco crimes:

 

  • abolição violenta do Estado Democrático de Direito: acontece quando alguém tenta "com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais". A pena varia de 4 a 8 anos de prisão.
  • golpe de Estado: configura-se quando uma pessoa tenta "depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído". A punição é aplicada por prisão, no período de 4 a 12 anos.
  • organização criminosa: quando quatro ou mais pessoas se reúnem, de forma ordenada e com divisão de tarefas, para cometer crimes. Pena de 3 a 8 anos.
  • dano qualificado: destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia, com violência e grave ameaça, contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima. Pena de seis meses a três anos.
  • deterioração de patrimônio tombado: destruir, inutilizar ou deteriorar bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial. Pena de um a três anos.

 

 

Condenação

 

Na apresentação das alegações finais – etapa anterior ao julgamento – a PGR reforçou o pedido de condenação do grupo crucial, composto por Bolsonaro, pelos cinco crimes.

O Ministério Público quer a soma das penas, o que pode fazer com que a punição chegue a 43 anos de prisão. A decisão quanto ao eventual tempo de pena será dos ministros da Primeira Turma.

Infográfico - Trama golpista: Os réus, os crimes e o cronograma do julgamento — Foto: Arte/g1

Infográfico - Trama golpista: Os réus, os crimes e o cronograma do julgamento — Foto: Arte/g1

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